Archives
No livro de fato a aproxima o aparece muito mais
No livro, de fato, ODQ cost aproximação aparece muito mais como uma metáfora do que como um tratado. Tudo parece girar em torno da palavra intuição ou de uma ideia de sensação. Algo a ver com o inexplicável. “ por que, ao entrar no quarto onde esse homem passa seus dias recluso [o homem imóvel], alguns visitantes uma atmosfera que guarda relação com o que se poderia considerar o futuro da América Latina”. Diga-se logo que a atmosfera do quarto é de tensão e violência, velhas conhecidas dos latino-americanos. E que a atmosfera é, sobretudo, de poder déspota e de relações escravistas, também velhas conhecidas da América Latina. Essa interpretação óbvia, porém, desmerece o livro de Bellatin, na medida em que esta não é só mais uma história das ditaduras latino-americanas. Parece-me assim, mais interessante tomá-la [a metáfora] como força bruta que impele a busca não de um sentido, mas de significâncias, como diria Roland Barthes. Uma significância talvez possa ser entrevista ao investigarmos o que mantém a atmosfera de tensão e medo no quarto e na casa inteira: os trinta cães raivosos prontos a obedecer aos comandos do seu dono. Perguntado sobre por qué escolheu a raça malinois para sua fábula, Bellatin responde: “Porque existia, na época em que me aproximei deles, o mito de que eram descendentes diretos do lobo. Que o homem não os tinha manipulado, como acontece com outras raças que acabam gerando animais problemáticos, e por isso a lealdade, a valentia e a inteligência eram conservadas em um estado mais puro.” Sabemos, claro, que os autores mentem muito, mas gostaria de explorar essa resposta porque ela dá uma outra volta para pensarmos a metáfora sobre o futuro da América Latina. Sobre o passado e o mito da raça pura, já sabemos. Sobre como os colonizadores europeus dominaram e reduziram aos seus comandos (ainda que enfrentando resistência e também sendo manipulados pela cultura americana) os “selvagens e os preguiçosos”, também já sabemos. Mas o futuro só podemos intuir. E podemos aqui lembrar um texto de Darcy Ribeiro da década de 1990, mas recentemente publicado: (2010), no qual ele faz um breve percurso histórico da colonização da América Latina e suas consequências até a root-leaf-vascular system axis comemoração dos 500 anos da chamada “descoberta”, que também quer dizer saque e genocídio. Nesse texto ele toca num ponto importantíssimo, creio, para qualquer reflexão sobre a América Latina hoje e que leva à minha leitura do livro de Bella-tin: como essas nossas civilizações se tornaram rapidamente ameaçadoras fora de suas fronteiras. Diz ele em tom irônico: “O povão latino-americano tanto se multiplicou que hoje excede, visivelmente, às necessidades da produção. Começa mesmo a causar preocupações. Que fazer de tanta gente desnecessária?” Como na casa do homem imóvel, a população ameaça se expandir, ameaça sair de sua jaula, ameaça, enfim, sair com sua raiva canina e despedaçar o mundo. Esse medo, essa ameaça, paira sobre a história de Bellatin como uma força contida pelo homem imóvel de perigoso humor instável, que pode perder [ou exceder] o controle à irritabilidade mínima. Tudo é o que é por causa desse medo e dessa possibilidade. Se os cães dessa raça menos manipulada, cujas lealdade, valentia e inteligência estariam conservadas em um estado mais puro extrapolassem os limites de suas jaulas [digamos, de suas fronteiras] ninguém estaria seguro. E, diga-se de passagem, há incidentes que mostram que o poderoso homem imóvel não tem o controle total sobre seus cães, apesar das incríveis demonstrações desse controle: “Apenas uma vez um dos cães desobedeceu às ordens do homem imóvel. Shakura, a cadela mais velha da casa, se lançou num descuido sobre a perna do aprendiz de instrutor. O homem imóvel insultou então o enfermeiro-treinador como nunca tinha feito antes. Imediatamente expulsou da casa o aprendiz de instrutor.”